Bahia tem média de 5 LGBTs assassinados por mês em 2017, aponta Grupo Gay

Desde janeiro de 2017, 23 pessoas LGBTs (lésbicas, gays, bissexuais e transexuais) foram mortas na Bahia, segundo balanço do Grupo Gay (GGB) divulgado nesta quarta-feira (17), que é o Dia Internacional de Combate à Homofobia. A média é de 4,6 pessoas assassinadas por mês. O número de mortes esse ano já chega perto do contabilizado durante todo o ano passado -- que foi 32.
 
O alto índice coloca a Bahia na segunda posição, entre os estados brasileiros, em número de mortes de LGBTs. Conforme os dados do GGB, em todo o país, desde o início do ano, já são 117 mortes violentas com conotação homofóbica. No mesmo período do ano passado, o número de homicídios contra LGBTs foi 15. "Os crimes não diminuem. Pelo contrário, só aumentam.
 
Os dados de crimes de ódio contra LGBT divulgados anualmente por nós não são capazes de revelar uma mudança positiva", comenta presidente do Grupo Gay da Bahia e historiador Marcelo Cerqueira. Somente em 2016, o ano considerado como o mais violento desde 1970 contra pessoas LGBTs, segundo a entidade, 343 pessoas foram mortas em todo o Brasil, 32 delas na Bahia. O estado baiano só perde para São Paulo, que no ano passado contabilizou 49 homicídios.
 
Rio de Janeiro (30 mortes) e Amazonas (28 mortes) também figuram entre os estados com maior número de crimes. Dos 343 assassinatos, 173 eram gays, 144 trans (travestis e transexuais), 10 lésbicas, 4 bissexuais e 12 heterossexuais (parentes ou conhecidos de LGBTs que foram assassinados por algum envolvimento com eles). Os dados, segundo o GGB, levaram à constatação de que a cada 25 horas um LGBT é assassinado no país.
 
Ainda de acordo com os dados levantados pelo GGB, 31% dos assassinatos ocorridos em 2016 foram praticados com arma de fogo, 27% com armas brancas, incluindo ainda enforcamento, pauladas, apedrejamento, além de casos com requintes de crueldade, nos quais houve tortura e queima do corpo da vítima. Segundo o balanço, predominaram as mortes de LGBTs com idades entre 19 e 30 anos (32%). Menores de 18 anos representam 20,6% das vítimas. Quanto à cor dos LGBTs assassinados, 64% foram brancos e 36% negros.
 
Segundo a entidade, somente em 17% dos homicídios registrados no ano passado os autores dos crimes foram identificados (60 de 343), e menos de 10% das ocorrências resultaram em abertura de processo e punição dos assassinos. Dentre os 60 criminosos identificados, praticamente a metade mantinha contatos próximos com as vítimas, seja como companheiro atual (27%), ex-amante (7%) ou parentes da vítima (13%). Clientes e profissionais do sexo, além de desconhecidos em sexo casual foram responsáveis por 47,5% dos crimes.
 
Violência
Na Bahia, um dos casos mais recentes de violência contra uma pessoa LGBT ocorreu na cidade de Presidente Dutra, região norte. A transexual Bárbara Trindade foi baleada, no dia 2 de abril, após marcar um encontro com um homem, que foi preso. Ela foi atingida no maxilar e nas costas e, desde então, segue internada em estado grave no Hospital Regional de Irecê. A vítima está sem os movimentos dos braços e das pernas, segundo informações do dirigente do PSOL, Davi Tourinho.
 
Bárbara aguarda por uma vaga para ser transferida há mais de um mês. Ela necessita ser levada para uma unidade de saúde que atenda às necessidades do tratamento. "Ela está sem os movimentos. Do pescoço para baixo não funciona nada", destacou Davi.
O suspeito de atirar em Bárbara é o frentista Domingos Mendes. Ele está preso na delegacia da cidade. O Ministério Público da Bahia (MP-BA) aprovou, no dia 5 de maio, o pedido para que a paciente fosse transferida. Contudo, a Secretaria de Saúde do Estado (Sesab) informou que não há vaga em outra unidade para fazer a transferência.
 
Bárbara contou, em um vídeo postado na internet, que havia marcado um encontro com Domingos Mendes, o suspeito, por meio de mensagens, no dia do crime. "Marcamos 23h, na Câmara Municipal de Presidente Dutra. Cheguei lá e fiquei esperando. Em seguida, chegou uma moto com duas pessoas, só que a rua estava muito escura, eu fiquei com medo e não fui. Em um determinado momento, ele [Domingos] desceu da moto e fez o primeiro disparo, que pegou no meu maxilar. Depois eu virei e tomei o segundo tiro, foi quando eu vi o rosto dele", relatou Bárbara.
A delegada Ezerlina Rocha, titular da Delegacia de Presidente Dutra, que investiga o caso, informou ao G1 que o inquérito foi concluído e enviado ao Ministério Público. O órgão denunciou o suspeito no dia 9 de maio. A delegada afirmou que, em depoimento no hospital, Bárbara disse que reconhece Domingos como a pessoa que atirou nela. No entanto, o suspeito nega o crime e ainda afirma que nunca teve nenhum relacionamento com a vítima.
 
A delegada informou que a polícia apura se o frentista marcou o encontro com Bárbara ou se alguém se passou por ele ao enviar as mensagens, via aplicativo, para o celular da transexual. A polícia pediu a quebra do sigilo telefônico do suspeito e da vítima. Até esta quarta-feira, o pedido ainda não havia sido atendido.
 
Parte de um coletivo LGBT que presta apoio à Barbara, Ruby Santos, diz que o suspeito atirou na jovem porque ficou insatisfeito após ela ter contado sobre o relacionamento para outras pessoas. O GGB ainda não contabiliza dados de agressões e tentativas de homicidios contra pessoas LGBTs, somente mortes. No entanto, a entidade informou que planeja, nos próximos anos, catalogar também casos como o da transexual Bárbara Trindade.
 
Combate à homofobia
O presidente do Grupo Gay da Bahia (GGB), Marcelo Cerqueira, lembra que 17 de maio foi escolhido como Dia Internacional de Combate à Homofobia porque, nessa mesma data, em 1990, foi quando a Assembleia Municial da Saúde, da Organização Mundial da Saúde (OMS), retirou a homossexualidade da Classificação Internacional de Doenças (CID).
 
"É necessário que todos entendam que combater a homofobia não é fazer propaganda de uma orientação sexual específica, mas, sem dúvida, promover direitos humanos, coletivos e difusos dos cidadãos, estimulando os LGBTs a reconhecerem e interagirem com esses direitos. Essa interação, inclusive virtual, cria ambientes e espaços sociais e de palavras para o fortalecimento da democracia como instrumento capaz de melhorar as relações entre as pessoas", destacou.
 
Um dos criadores e coordenadores do grupo de pesquisa Cultura e Sexualidade (CUS) da Universidade Federal da Bahia (UFBA), o professor Leandro Colling, salienta que classifica o quadro de violência contra LGBTs como "alarmante", apesar de "previsível", e diz que faltam políticas públicas para que esse cenário mude. Ele diz que o Dia Internacional de Combate à Homofobia é importante para que a discussão sobre o quadro do país sobre essa questão ganhe destaque.
 
"Esse dia é impotante para que essse tipo de discussão sobre violência ganhe visibilidade, para que as pessoas se atentem para discutir a orientação sexual e identidade de gênero. Infelizmente, para quem pesquisa e é militante dessa causa, o aumento da violência não surpreende. Aliás, diante do quadro que vivemos hoje, com a falta de políticas públicas voltadas para combater o preconceito de ódio e de gênero, o que a gente teme é que essa violência aumente cada vez mais. O quadro, infelizmente, nao é de esperança para que isso diminua", destaca.
 
A violência contra pessoas LGBTs será um dos temas a serem dicutidos na "Mostra CuS 10 anos", que acontece em Salvador de quinta-feira (18) até o sábado (20). A mostra comemora uma década do grupo de pesquisa em Cultura e Sexualidade (CUS) da UFBA.
 
O evento, que conta com artistas, historiadores, jornalistas, psicólogos, para discussão de assuntos sobre gênero, sexualidade e política, será na Goethe-Institut Salvador, localizado no Corredor da Vitória. O evento terá talk shows, exposição de arte, exibição de filme, apresentação de espetáculo de teatro, performances, oficinas, além do show de Linn da Quebrada, no sábado, que encerra a programação na Praça Pedro Arcanjo, no Pelourinho. A programação completa pode ser conferida no site do evento. G1

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