
Foto: Reprodução / Aratu Online
A história da “última cafetina” de Cachoeira, no Recôncavo,
levou pesquisadores e até quem nunca tinha frequentado “uma casa de
tolerância” a entrar no “Brega de Cabeluda”, como é conhecida a casa de
número 12 na Rua Sete de Setembro. O fato ocorreu na última terça-feira
(5), e o motivo era a defesa da dissertação de mestrado de Gleysa
Teixeira. Formada em história pela UFRB e agora mestre em ciências
sociais, a pesquisadora decidiu contar sobre uma das lendas vivas da
cidade. “Minha ideia era dar visibilidade à história de Cabeluda, que
faz parte dessas mulheres estigmatizadas, marginalizadas e excluídas”,
conta Teixeira em entrevista ao Bahia Notícias. A historiadora disse
que, apesar de sofrer na pele o peso do preconceito, “Cabeluda”
conseguiu ser um exemplo de “empoderamento”, palavra associada à
afirmação feminina. “Ela conseguiu sobreviver e se manter e, apesar do
patriarcado, fez um nome na sociedade. Ela é praticamente uma lenda viva
da cidade”, relata. Para a tembém professora, o fato de apresentar o
trabalho no “brega” também serviu para descontruir e tirar o véu
negativo do lugar. “Na minha infância ouvi muito as pessoas falarem,
‘ah, mulher direita não pode andar na rua do brega’, e muita gente não
passava mesmo. Eu sei que existem questões atuais que envolvem crimes em
alguns lugares. Mas a gente também tem que quebrar estas visões
estereotipadas. Porque o exemplo de Cabeluda é de empoderamento. Não há
relato de que ela explorava as mulheres”, argumenta.

Vista de Cachoeira / Foto: Reprodução / Jeito Baiano
A prostituição é discutida por Gleysa sem tabu. “É um debate
que divide as feministas. Existe uma ala que vê prostituição como
exploração do corpo da mulher, mas tem outro ala que diz que a mulher é
dono do próprio corpo e pode fazer dele o que bem entender. Agora, ela
não pode se submeter a uma exploração. Eu tenho uma opinião que o ser
humano tem desejo, vontade, e da mesma forma que ele compra algo para se
satisfazer, o sexo também pode ser pago”, discute. Apesar de se sentir
“assustada” com a repercussão do estudo, Gleysa diz que a resposta da
comunidade foi gratificante. “Confesso que estava com medo da
repercussão, mas não era em relação a críticas, como ‘ah, porque foi
estudar o brega’, não era isso. Eu estava assustada por não poder dar
conta, mas houve uma grande aceitação”, revela. Conhecida pelo nome de
“Heroica”, pela consolidação da independência do Brasil, em 1823,
Cachoeira, na visão de Gleysa Teixeira, pode fazer mais ao inscrever
gente como Cabeluda no tempo oficial. “A historiografia local de
Cachoeira foi sempre contada a partir dos feitos heroicos, das figuras
ilustres, da escravidão, dos terreiros de candomblé, da Boa Morte, que
são importantes, mas chegou a hora de a gente entender que a rede de
prostituição de Cachoeira precisa ser olhada de forma diferenciada
porque fez parte do cotidiano”, completa a autora do trabalho “Uma
história de Cabeluda, mulher, mãe e cafetina”. Aos 73 anos, a própria
Cabeluda assistiu à apresentação da dissertação na última terça.
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